“Ouro de tolo”: Nova Lima, a dependência da mineração e uma difícil encruzilhada - Interesse de Minas

“Ouro de tolo”: Nova Lima, a dependência da mineração e uma difícil encruzilhada

Conhecido como “A Cidade do Ouro”, o município de Nova Lima sempre foi um dos orgulhos do estado de Minas Gerais

(Foto: Rodrigo Melo)

Por Maíra Oliveira,
jornalista e moradora de Nova Lima | Especial para o portal Interesse de Minas

São 318 anos de história que remetem à exploração do minério. Conhecida como “A Cidade do Ouro”, Nova Lima sempre foi um dos orgulhos de Minas Gerais: bons índices econômicos, muita história e cultura repleta de referências, que ainda encontramos hoje, em nosso cotidiano.

A exploração do ouro começou por volta de 1725 e, quase dois séculos depois, a chegada dos ingleses ao município, com foco na extração do desejado minério, fez com que Nova Lima se estruturasse em uma cultura tipicamente inglesa. A culinária e a arquitetura, por exemplo, são pontos marcantes até hoje.

Com o tempo, a exploração do ouro foi prosperando e trazendo bons resultados, o que fez a cidade abrigar a mina mais profunda do mundo. Para melhorar as condições de vida e de trabalho da população, que praticamente vivia para e pela exploração do minério, foram feitos investimentos em estrutura e mobilidade e melhoradas as condições de vida das pessoas, que construíram famílias e fincaram suas raízes por aqui. 

Já o minério de ferro teve sua exploração em larga escala iniciada em 1958 pela Minerações Brasileiras Reunidas (MBR), que foi adquirida pela Vale. Atualmente, a Vale, juntamente com outras mineradoras, atuam no município.

“Vidas perdidas, famílias e casas destruídas, histórias apagadas. E agora, como devemos proceder?”

A história de Nova Lima traz, sem dúvidas, um misto de crescimento, desenvolvimento e prosperidade. Mas a inconsequência da exploração do meio ambiente e a ganância têm cobrado um preço alto, que não pode ser reavido: vidas.

Vidas perdidas, famílias e casas destruídas, histórias apagadas. E agora, como devemos proceder? A verdade é que nascemos da exploração do minério, crescemos e evoluímos com essa atividade e, hoje, podemos dizer que somos dependentes dela. Isso porque, atualmente, Nova Lima recebe quase R$ 200 milhões, por ano, de Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), chamada de “royalty do minério”. Desse montante, quase metade vem da Vale.

Outro dado alarmante é trazido pela Federação das Indústrias de Minas  Gerais (Fiemg): com a paralisação temporária das atividades de 10 minas da Vale, como informado pela mineradora, após o rompimento da barragem de Brumadinho, a expectativa é de que os 3,3% do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de Minas Gerais, previstos para 2019, caiam para 1,7%.

Ainda de acordo com a Fiemg, a indústria extrativa é responsável por um quarto da produção industrial de Minas e por 2,1% do PIB, o que afeta, diretamente, outros segmentos da economia: a cada R$ 100 milhões a menos no setor, perdem-se R$ 25 milhões em outras áreas.

“Como não nos preocupar com o que o futuro nos reserva?”

Mas, afinal, é justo falarmos de números agora, quando tantas vidas foram perdidas, primeiro em Mariana, em 2015, e, recentemente, em Brumadinho? Como não falar? Como não nos preocupar com o que o futuro nos reserva? Com a queda da arrecadação, entramos em uma espiral de desemprego, falta de investimento e de condições para seguirmos.

Apesar de todo sentimento de revolta e sede de justiça, é fundamental fazermos uma reflexão e partir para a ação, de forma racional, mas rápida, sobre como Nova Lima e os municípios mineradores podem encontrar uma solução que, no fim das contas, precisa ter a atenção em um único ponto: a preservação de vidas e a busca por qualidade, conforto, oportunidades e segurança.

Sem medo, sem estar à espera do toque de um alarme, avisando que se deve deixar tudo para trás. Nossa história se fez com o puro e literal ouro. Mas, a partir do momento em que ele se transformou em “ouro de tolo”, nós precisamos agir.

Por todos que se foram e por nós, que ficamos.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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